TJMG proíbe que bancos cobrem taxas e juros de débitos quitados antecipadamente

Medida contraria o Código de Defesa do Consumidor. Instituições têm de arcar com risco da atividade

postado em 02/02/2015 00:12 / atualizado em 02/02/2015 07:39
Pedro Rocha Franco

Decisão judicial do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) impede o Banco Santander de cobrar dos clientes taxas e juros em caso de pagamento de parcelas de financiamentos de bens ou outros empréstimos antes do prazo de vencimento. A cobrança imposta por instituições financeiras quando o cliente resolve antecipar a quitação de débito contraria o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Como parte de outro processo com idêntico teor, que obteve decisão judicial no ano passado, o Banco Bonsucesso foi obrigado, na semana passada, a publicar edital de convocação de clientes que têm direito a reaver valores pagos pela tutela antecipada.

O caso de cobrança indevida é simples. O consumidor faz um empréstimo ou financiamento bancário em determinada quantidade de prestações, mas decide antecipar parte das parcelas previstas para o final do contrato. Com base no CDC, a instituição financeira não pode cobrar juros ou qualquer outro tipo de acréscimo sobre esse valor. Segundo a advogada Lilian Salgado, da entidade autora das ações coletivas pertinentes a essas situações – Instituto Mineiro de Políticas Sociais e de Defesa do Consumidor (Polisdec) –, foi constatado que mais de 20 bancos efetuavam cobranças indevidas. O valor recalculado do montante a ser cobrado não conferia com o que deveria de fato ser pago pelo cliente. O total cobrado, de acordo com o Polisdec, alcançava até R$ 5 mil além do devido. Tratava-se da chamada tarifa de liquidação antecipada. 

Essa forma de pagamento é muito comum na compra de imóveis. O cliente faz o financiamento em 30 anos, mas paga antes as últimas parcelas para escapar dos juros. A maioria das reclamações, no entanto, foi referentes a financiamento de veículos e empréstimo consignado. “É importante salientar que a liquidação precoce do contrato não prejudica a instituição financeira, a qual deve arcar com os riscos assumidos em virtude de sua atividade, sendo, na verdade, beneficiada com o pagamento antecipado, reduzindo o risco de inadimplência e, por consequência, obtendo a recuperação do seu patrimônio antes do previsto”, afirmou em decisão de primeira instância o magistrado José Maurício Cantarino Villela no processo referente ao antigo ABN Anro, incorporado pelo Santander.

O banco recorreu da decisão, mas em acórdão publicado na quarta-feira passada os desembargadores da 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais negaram o recurso da instituição, confirmando a proibição da cobrança. Pela decisão, os bancos são obrigados a devolver o valor cobrado dos clientes mineiros. A autora da ação diz que vai recorrer da decisão por entender que a devolução deve ser válida para todo o país. 

O problema com a taxa teve forte repercussão em vários estados anos atrás. Milhares de consumidores procuraram órgãos de defesa do consumidor para reclamar o pagamento indevido. Entre 2004 e 2008, foram registrados 10,8 mil casos de liquidação antecipada no país, se consideradas as queixas no Banco Central e no Procon de Belo Horizonte. O caso foi o segundo com mais reclamações no BC em março de 2008. Na capital mineira, foram 1.310 casos em 2008.

OUTROS CASOS Além das ações contra o ABN Anro (hoje Santander) e o Bonsucesso, a entidade entrou com ações coletivas contra os bancos Rural, Safra, BMG, Alfa e BV Financeira. Os processos estão, ainda, em tramitação. O Bonsucesso diz não cobrar a tarifa desde 2007. Em nota, o Santander afirma que irá recorrer da decisão e que aguarda a posição final do Judiciário. “O Conselho Monetário Nacional autorizou expressamente a cobrança da TLA e, por isso, inexiste qualquer irregularidade”, diz nota do banco.

Depois de fazer um financiamento para comprar um carro, Sônia Lúcia de Oliveira decidiu antecipar parcelas para escapar dos juros. Ao informar a decisão à financeira, foi comunicada de que deveria pagar uma tarifa pela antecipação. “Como precisava quitar o carro, paguei. Mas entrei na Justiça para recuperar o dinheiro”, afirma Sônia. Ela acionou o Juizado Especial Cível e, meses depois, recebeu em dobro o valor pago indevidamente.

O recebimento em dobro foi um ganho individual de Sônia. Nas ações coletivas, a Justiça não tem um posicionamento consensual sobre o tema. Em 21 de janeiro, o TJMG determinou a publicação de edital para dar publicidade à decisão, que define a devolução do valor. “O consumidor deve reunir comprovante dos pagamentos e entrar com execução para reaver o valor pago”, afirma a advogada Lilian Salgado.

O que diz o Código

Artigo 52 – No fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, o fornecedor deverá, entre outros requisitos, informá-lo prévia e adequadamente sobre:Parágrafo 2º – É asseguradoao consumidor a liquidação antecipadado débito, total ou parcialmente, medianteredução proporcional dos juros e demais acréscimos.

O consumidor deve reunir comprovantesdos pagamentos e entrar com execução para reaver o valor pago - Lilian Salgado, advogada do Instituto Mineiro de Políticas Sociais e de Defesa do Consumidor

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